segunda-feira, 30 de abril de 2012

poema n° VIII


                        VIII 

Enquanto o trem 
                             Despacito
Serpenteia a montanha
                             De olivos


Miro assustada
Os olivos, os olivos...
 

E donde grita indômita
                              A natureza
Acolhera-se com ela
                              O meu pensamento.

a biblioteca

[compõe com uma foto do interior da biblioteca]

 
Para compor o fim da tarde
É preciso recolher-se.
Guardar-se
Como material incandescente
Sobre as barreiras do tempo.

Mergulhar de temor despido
Quando se abre a porta
Da frente
E por entre todas as frestas
Ungido
Aportar com vento diverso.

Navegar pelos frios ares imensos
E no silêncio do ambiente úmido
Do salão
Pontilhado de pesado mobiliário
E panteão
Dispor-se a ser o seu mesmo reverso

Pois o gosto da leitura exige esforço
Abandonar-se noutra vida
Que não a sua
E ter corridas pelas mãos
Os enormes prazeres do outro mundo.

 

o antigo pelourinho - as docas do mercado


 [este poema requer uma foto do antigo pelourinho, hoje docas do mercado]
           
Pela manhã bem cedinho
O ar se encapela como se fosse água ventosa.
Mar de dentro – quase o mar de dentro! 
Canal que acessa o cais 
Da cidade à beira do caos.


Ouve-se o pescador em sua pressa matinal: 
Tainha gorda, linguado, camarão!
O rumor dos passos abafados na água que vem do gelo... 
Encontrões de ombros pesados
Nas galerias de gentes que se formam 
Tão logo atracam os caícos abarrotados 
De pescado fresco da noite...


E o antigo pelourinho ressurge 
Na memória perdida dos riograndinos: 
- esta negra tem bons dentes! 
- o mais preto, o mais escuro, o mais negro! 
Mas sempre se perguntam os mais jovens 
Se ainda haverá alvorecer limpo 
Para a escravaria nas amarras no Pelourinho...

  
Passado um pouco do meio dia 
O vozerio arrefece e entristece 
Como a calmaria dos temporais anunciados 
Mar de dentro – quase o mar de dentro! 
O tempo que é história não cala 
Porque a vida sempre lhe serve e salva...